Não é uma tarefa simples conceituar o fenômeno da violência, sobretudo a violência urbana. A Organização Mundial da Saúde já tipificou a violência em três aspectos, podendo classifica-la como auto-infligida, interpessoal e coletiva, sendo que a violência auto-infligida pode ser observada por meio de uma conduta suicida ou conduta de auto abuso. O indivíduo se retalha e se corta, ainda que num ambiente aparentemente sem uma causa que justifique seu conflito. A violência interpessoal, por sua vez, envolve os familiares ou pessoas da comunidade em que o indivíduo reside – vizinhos, por exemplo. Já a violência coletiva pode ser de ordem social, política ou econômica. (Dahlberg; Krug, 2002, p. 1166.) A violência tem amplos desdobramentos quando combinada com a natureza do conflito, que pode ser de ordem física, sexual, psicológica ou envolvendo privação ou negligência.

É plausível ainda analisar a violência como a revolta por uma insatisfação social, pois a desigualdade social é, sobretudo, uma forma de violência. Violência, nesse caso, seria a luta desesperada para corrigir o que o indivíduo julga serem injustiças sociais. Ora, a violência associada à adolescência tem sido debatida às largas nos últimos anos. Contudo, boa parte dessas discussões não se preocupa com os fatores causais, antes se debruça sobre os efeitos da violência numa vã tentativa de explicar o fenômeno a partir de sua redução a fatos sem a preocupação de analisá-los de modo isento.

Compreender o fenômeno da violência num contexto “prisional”, cujos atores são adolescentes, é uma tarefa que exige um olhar voltado para as causas imediatas e mediatas, mais do que para seus efeitos, pois “mudanças tão profundas estão em jogo que é legítimo acentuar as inflexões e as rupturas da violência, mais do que as continuidades” (Wieviorka apud Waiselfisz, 2002, p. 17).

Em se tratando de violência no mundo juvenil, os sistemas de relações sociais têm sido pouco explorados ou mesmo ignorados. O estudo da violência entre adolescentes reclusos requer análise de seu sistema de relações sociais, pois “a história revela que os institutos criados para abrigar e reeducar adolescentes tiveram como tônica a repressão e a punição, o que, sem dúvida, contribuiu para fomentar a violência, gerando adultos potencialmente criminosos” (Cella; Camargo, 2009,  p. 285). Cada experiência vivida pelo adolescente infrator e, neste caso, privado de sua liberdade, é de fundamental importância para a compreensão da dinâmica da violência num ambiente prisional, cujos atores eram, antes da reclusão, de uma peça montada em um cenário de transgressão social.

 

  1. A precariedade das unidades de ressocialização de adolescentes infratores

As unidades de ressocialização de adolescentes em conflito com a lei, que deveriam estar devidamente habilitadas para reeducar e ressocializar o adolescente infrator não resistem a uma auditoria mínima, pois em grande medida são pardieiros adaptados em sua estrutura espacial, nos quais os adolescentes ali internados são submetidos a uma dinâmica diária humilhante. De um modo geral as instituições de reclusão de menores têm se mostrado deficientes, tanto em sua estrutura física, quanto à mão de obra qualificada para empreender a tarefa de reeducação.

Tais unidades, de modo geral, se caracterizam: 1) pela má disposição do espaço físico. A maioria das construções é velha, reformada e reutilizada para fins que não os objetivados inicialmente; 2) pela falta de limpeza, principalmente nas celas destinadas às “disciplinas”. Os “Pavilhões de Disciplina” se caracterizam pela sujeira e mau cheiro, próprios da disciplina antisséptica. Nesses pavilhões, a falta de acesso aos banheiros é comum; 3) pela ociosidade dos adolescentes na maior parte do tempo. Os adolescentes ficam trancados nos pátios coberto das Alas a maior parte do tempo, de maneira improvisada, jogando bola ou conversando; 4) pelo cheiro de fezes, urina e suor, que invade os corredores das instituições, uma vez que os menores trocam de roupa poucas vezes por semana. Em algumas instituições, como no Instituto Padre Severino, no Rio de Janeiro, de acordo com auditoria realizada em maio e junho de 1997, foi apurado que os menores só trocavam de roupa uma vez por semana, não possuíam toalhas para tomar banho, nem escovas de dente (Arantes, 2000, p. 42); 5) pela precariedade de recursos nas instituições e a presença no quadro de funcionários de indivíduos que “não apresentam condições de realizar atividades sócio-educativas, conforme estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente” (Arantes, 2000, p. 42). Em boa parte das unidades de reclusão de menores a lógica da massificação despersonalizante se torna evidente na identificação numérica que a instituição faz do menor: “o de internação, o dos artigos pelos quais foi enquadrado e o do alojamento sempre lotado onde vive e no total despojamento dos objetos pessoais” (ASSIS, 1999, p. 44); 6) pela superlotação. De acordo com O Estatuto da Criança e do Adolescente as instituições para ressocialização sob medida estrita, isto é, sob reclusão, devem ter no máximo quarenta adolescentes, o que proporcionaria uma atendimento individualizado. Tal não acontece atualmente, pois as instituições em muito ultrapassam esse patamar de quarenta pessoas para cada instituição. Há registros de instituições em que uma mesma cama era ocupada, simultaneamente, por dois menores (Arantes, 2000, p. 42); 7) pela rígida hierarquia e vigilância, exercidas mediante intensa repressão e constantes ameaças por parte da equipe de agentes; 8) pela violação constante do artigo 124 do Estatuto da Criança e do Adolescente; 9) pelo baixo nível de escolaridade dos internos. Nessas instituições para reclusão de menores é possível encontrar não apenas crianças e adolescentes com baixo nível de escolaridade, como também menores completamente analfabetos e que jamais frequentaram uma escola.

A precariedade das unidades de reclusão conflita com o alto número de funcionários do Estado. Dados do relatório da auditoria operacional, do Tribunal de Contas do Distrito Federal, com o objetivo de acompanhar as ações dedicadas às crianças e adolescentes em conflito com a lei, datado de 3 de setembro de 2013 percebe um grande número de servidores nas unidades de internação, sob sua jurisdição.

Assim, enquanto no CAJE havia 320 servidores para 371 internos, no CIAGO havia 289 servidores para 145 internos, por exemplo. Além disso, os dados de 2009 apontavam para a existência de mais servidores no CAJE I que em 2011. Tais dados parecem revelar discrepância, além de não terem sido esclarecidas, claramente, quais eram as demandas por profissionais faltantes, em correlação com o concurso realizado. (Relatório Final de Auditoria do TCU, 2013, p.2).

A despeito do alto número de servidores e sua discrepância entre as unidades de internação, as Unidades de Atendimento em Meio Aberto do DF enfrentavam problemas de estrutura física como a existência de excedentes de menores em cada Unidade do Sistema, estrutura física precária em diversas unidades de atendimento, sendo as principais dificuldades encontradas: poucos computadores para os servidores, falta material (papel, cartucho etc), ausência de espaço adequado para o arquivamento dos documentos da unidade, falta segurança física nas instalações, que já sofreram arrombamento, com furto de computador, ventilação inadequada nos ambientes. Na Unidade de Atendimento em Meio Aberto de Taguatinga, constatou-se que havia camas para apenas 36 menores. Desse modo, cinco menores estavam dormindo em colchonetes. Segundo o relatório, nesta mesma unidade “existe problema estrutural grave na rede interna de esgoto o que faz exalar, principalmente à noite, mal cheiro muito forte”. (Relatório Final de Auditoria do TCU, 2013, p.17).

Constata-se que, após promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente, as instituições, cujo propósito serviria à reeducação e ressocialização do menor infrator, “ainda não se transformaram em unidades de reabilitação, nem se criaram instancias que dariam retaguarda comunitária aos jovens” (Assis, 1999, p. 45). Muitas instituições de internação transformaram-se em ambientes prisionais, alterando a relação de sociabilidade entre os dirigentes e os internos sob medidas sócio-educativas. Em algumas dessas instituições as polícias militar e civil que antes encerravam seu papel ao conduzir o menor até o espaço reservado a internação, acabam transitando e ocupando cargos dentro da própria instituição.

A discrepância entre o que prescreve o Estatuto da Criança e do Adolescente e a prática é grande, de modo geral, nas instituições que deveriam cuidar para que os infratores estivessem sob medidas sócio-educativas. Segundo o Artigo 94 do Estatuto da Criança e do Adolescente “as entidades que desenvolvem programas de internação têm as seguintes obrigações, entre outras: 1) observar os direitos e garantias de que são titulares os adolescentes; 2) não restringir nenhum direito que não tenha sido objeto da restrição na internação; 3) oferecer atendimento personalizado, em pequenas unidades e grupos reduzidos; 4) preservar a identidade e oferecer ambiente de respeito e dignidade ao adolescente”. O Artigo 185 do mesmo Estatuto ainda prescreve: “A internação decretada ou mantida pela autoridade judiciária não poderá ser cumprida em estabelecimento prisional”. Atualmente as crianças e adolescentes sob medida sócio-educativa estrita, isto é, internados, não apenas se encontram presos em celas, em quase todas as instituições, como também não recebem atendimento personalizado, uma vez que as “pequenas unidades e grupos reduzidos” tornaram-se concentrações volumosas. A maioria das unidades de reclusão de menores mantém em suas instalações centenas de infratores derrubando por completo o “atendimento personalizado” e transformando-o em atendimento coletivizado. O mesmo Estatuto, em seu Artigo 124, item “V”, ainda esclarece que o adolescente privado da liberdade deve ser “tratado com respeito e dignidade”, e no Artigo 125, que é “dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhes adotar as medidas adequadas de contenção e segurança”. Em uma simples visita a uma unidade de reclusão de menores infratores, percebe-se o não cumprimento de muitos princípios legais estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, dificultando em muito sua ressocialização e reintrodução na sociedade.

Os problemas relacionados às unidades de reclusão para menores infratores são complexos e sua solução depende de uma gama de fatores não menos intrincados. De acordo com a FONACRIAD,[1] nos anos 90 “apenas 40% das unidades de atendimento a adolescentes autores de ato infracional declararam possuir uma proposta pedagógica para a execução das mediadas sócio-educativas de internação”. (Ministério da Justiça, 1998, p. 36). O cenário das instituições de internação de adolescentes infratores pouco mudou da década de 1990 até hoje. Não bastasse a deficitária proposta pedagógica nas unidades de internação, dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE/2010) revelam que, do lado de fora das internações, 44% dos municípios brasileiros não apresentam nenhum plano municipal de educação visando ao cumprimento das metas educacionais municipais. Somando-se a essa ausência de plano educacional há ainda o fato dos governos sucessores não darem continuidade aos projetos dos governos anteriores (Mandelli, 2017). Há ainda que se considerar que a taxa de analfabetismo funcional para pessoas com mais de 15 anos de idade, tendo menos de quatro anos de estudos, foi estimada em 21% em 2008 (Farid, 2009). Isso é alarmante, pois o adolescente em conflito com a lei não tem pouquíssima opção educacional na sociedade civil e, muito menos, nos centros de internação visando à sua ressocialização. Não é sem razão que em carta circular aos prefeitos de sua região, já em 03 de dezembro de 1832, portanto, há mais de 180 anos, o ministro Comte d’Argout já afirmava que “uma prisão jamais será uma casa de educação” (Peyre, 1982, p. 3).

Em maior ou menor escala as unidades de internação de todos os Estados brasileiros enfrentam grandes problemas. Os recursos financeiros são parcos e insuficientes, pois boa parte desses recursos que deveriam ser investidos nas unidades de internação para menores sob medidas sócio-educativas acabam se desviando para a área de segurança, para melhorar o aparato policial.[2] Essas dificuldades são diluídas no cenário social, de tal forma que se tornam imperceptíveis. Diante desse quadro, “a necessidade de tornar invisíveis aspectos que representam a desordem, o caos e o conflito acaba por discriminar e excluir não apenas o adolescente infrator, mas também aquele cujo trabalho é a eles dedicado, o educador, que sofre, por um lado, a discriminação e, por outro, vivencia, todos os dias, a insuficiência de seu trabalho” (Cella; Camargo, 2009, p. 297).

Boa parte das autoridades civis e militares entende que o problema da criminalidade juvenil se resolve com repressão e não com ressocialização. Essa política, adotada nos últimos anos, não tem provocado efeito positivo, uma vez que o índice de criminalidade e violência entre os jovens aumenta consideravelmente a cada ano.

Segundo Atílio Machado Peppe, que ocupou a função de gerente do programa de reinserção social do adolescente em conflito com a lei, do Departamento da Criança e do Adolescente/Ministério da Justiça, “na realidade, os responsáveis pelas políticas e práticas de atendimento sócio-educativo se deparam com problemas de enfrentamento percebidos como mais urgentes para a consolidação do processo de reordenamento institucional, a maioria dos quais impostos pela cultura correcional-repressiva hegemônica” (Peppe, 2001, p. 5).

Como se não bastassem os graves problemas relacionados à estrutura da privação de liberdade, há de se considerar ainda que a privação da liberdade como medida sócio-educativa para adolescentes infratores traz mais malefícios do que benefícios, uma vez que o ambiente prisional produz efeitos negativos intensos sobre a personalidade dos aprisionados, provocando no adolescente em conflito com a lei uma “sedimentação do sentimento de rejeição” (Mazerol, 1982, p. 186).

 

  1. A ineficiência das instituições de ressocialização de adolescentes

O Estatuto da Criança e do Adolescente, instituído pela Lei Federal nº 8069/90 de 13 de julho de 1990, revogou o Código de Menores de 1979 e o FUNABEM, trazendo consigo todos os direitos da criança e do adolescente, adotando, em seu 1º artigo, a Doutrina de Proteção Integral, que reconhece a criança e o adolescente como cidadãos de direitos. Inicialmente, o ECA foi criado inicialmente como lei complementar, com o intuito de regular os dispositivos já presentes na Constituição Federal de 88, no se que referia à proteção da infância e juventude, ou seja, foi criado para propiciar a real efetivação desses dispositivos. O ECA, conquanto tenha sido criado como lei complementar, atendeu uma série de premissas trazidas pela Carta Magna de 1988, visando à proteção do adolescente em conflito com a lei, bem como relembrando e ressalvando os deveres da sociedade, do Estado e da Família para com esses jovens. Nesse sentido, Meneses defende que o ECA, por si mesmo, acabou gerando três sistemas de garantias à ressocialização do adolescente em conflito com a lei.

Estabeleceu o Estatuto da Criança e do Adolescente três sistemas de garantias. O sistema primário, que diz respeito às políticas públicas, de atendimento à criança e ao adolescente; o sistema secundário, que se relaciona à proteção; e o sistema terciário, no qual se encontram as medidas socioeducativas, decorrentes da prática do ato infracional. A partir do Estatuto, crianças e adolescentes brasileiros, sem distinção de raça, cor ou classe social, passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direitos e deveres, considerados como pessoas em desenvolvimento a quem se deve prioridade absoluta do Estado (Meneses, 2008, p. 61).

Apesar de todas as garantias dadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, quando se trata de estudar as relações sociais nas instituições de internação para crianças e adolescentes infratores, depara-se com problemas graves que, em grande medida, intensificam a violência e a criminalidade. Antônio Carlos Gomes da Costa, estudioso do sistema sócio-educativo aponta os principais fatores característicos da “desordem” imperante na maior parte das instituições. Segundo Costa, os principais problemas que mantêm a violência nas instituições de reclusão para crianças e adolescentes infratores são:

1) os quadros de pessoal inadequados; 2) a existência de atitudes prepotentes e de alianças espúrias entre pseudo-educadores e lideranças juvenis; 3) a tática das “situações-limite” provocadas intencionalmente pelos adolescentes, como arma para enfrentar o parco repertório de respostas sócio-educativas das instituições; 4) a visão institucional da arbitrariedade como “mal necessário” na contenção da violência; 5) o pacto de silêncio com relação aos fatos de violação dos direitos dos adolescentes ocorridos na instituição; 6) a preocupação dos dirigentes focada mais na necessidade de “tirar a instituição dos jornais” sem efetuar as mudanças profundas; 7) o “acordo” não escrito entre as equipes dos técnicos, que se desincumbem de funções especializadas, e os encarregados da disciplina, que se incumbem “do resto”, no cotidiano das instituições, ou seja, a utilização do álibi funcional para mascarar a cumplicidade passiva quanto aos fatos de arbitrariedade e violência cometidas contra os adolescentes; 8) a fragilidade das propostas sócio-pedagógicas (Costa apud Peppe, 2001, p. 5)

Como se não bastassem esses fatores fomentadores da violência reclusa, ainda há de se considerar a existência de contradições inerentes ao regime de internação de adolescentes infratores que, invariavelmente acirram a violência latente no ambiente de reclusão e a reencaminha potencializada para o seio da sociedade, quando o adolescente deixa a unidade. Peppe também aduz os seguintes questionamentos:

1) Como realizar as exigências de re-educação da liberdade responsável constitutiva do processo sócio-pedagógico de reinserção social do adolescente autor de ato infracional, enquanto submetido à lógica opressiva e repressiva que, na perspectiva de Foucault, caracteriza as ‘instituições totais’, esmagadoras da subjetividade, da autonomia e das identidades individuais? A institucionalização do adolescente, como pessoa em desenvolvimento, sempre estará correndo fortes riscos de despersonalização e de recrudecimento da violência individual e coletiva; 2) a predominância da ociosidade mórbida dos internos, muitas vezes reforçada pela artificialidade das formas de atividade, destituídas de sentido pedagógico e produtivo, fonte inevitável de esvaziamento existencial e busca de compensações perversas, sobretudo nas áreas afetivo-sexual e de drogadição; 3) a utilização arbitrária de inclinações e comportamentos homossexuais como arma de dominação entre internos entre eles e falsos educadores, reforçando o subserviência freqüentemente imposta aos adolescentes no cotidiano das unidades e, ainda, agravada pela “lei do silêncio”, atrelada não só aos sentimentos de vergonha, mas sobretudo às relações internas de poder; 4) a saúde afetivo-sexual dos adolescentes internos do sistema sócio-educativo, aliada à saúde mental (como resistência aos aliciamentos do mundo das drogas), tende a ser um dos direitos fundamentais mais esquecidos e silenciados. Além de sufocado pela avalanche de múltiplas violações de direitos, equipara-se à imagem de um “vespeiro” que mexido desajeitadamente pode desencadear um enxame insuportável de problemas para a frágil capacidade de resolução sócio-educativa dos mesmos pelas instituições de internação (Costa apud Peppe, 2001, p. 5).

Relatório do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) afirma em 2013 que as unidades de medidas socieducativas para menores infratores continuam com problemas semelhantes aos encontrados no início dos anos 2000, estando superlotadas em 15 estados, bem como no Distrito Federal. À época em que o relatório de 2013 fora executado havia 15.414 vagas em todas as unidades da federação, conquanto, o total de jovens cumprindo medidas socioeducativas era de 18.378, revelando um déficit de quase três mil vagas (Rodrigues, 2013.). O amplo estudo foi realizado por integrantes do Ministério Público em todo o país, que inspecionaram 287 das 321 unidades de internação do país, à época, equivalendo a 89,4% do total de unidades. Entre as unidades de semiliberdade, foram visitadas 105 das 122 do país, perfazendo 86,1% das unidades de semiliberdade.

O estudo concluiu que as unidades para menores são, na verdade, um reflexo dos presídios para adultos em todo o país, onde a superlotação é uma realidade há muitos anos. Para o CNMP, a situação de superlotação e a falta de educação e equipamentos de lazer adequados prejudicam a ressocialização desses menores (Rodrigues, 2013).

A discrepância entre o que prescreve o Estatuto da Criança e do Adolescente e a prática é revelada assim que se visita uma das várias unidades de internação de adolescentes em conflito com a lei, espalhadas pelo país. Em pesquisa publicada em 2015 pelo Conselho Nacional de Justiça, detectou-se que a unidade de internação de Santa Maria, no Distrito Federal, era a mais dura no aparato de reclusão. Os pesquisadores concluíram que “o regime de contenção das meninas pareceu o mais severo de todos os visitados no Brasil” (Mello, 2015, p. 56.). com uma dinâmica que se assemelhava a um presídio e não a uma unidade de ressocialização de adolescentes em conflito com a lei.

Sem dúvida, de todas as unidades femininas conhecidas pela equipe na pesquisa, a de Santa Maria é a que mais se assemelha a um presídio. A arquitetura é de uma penitenciária e a dinâmica de administração do tempo e da liberdade das meninas internamente, também. A unidade fica muito próxima a um batalhão da Polícia Militar. Os agentes e assistentes socioeducativos utilizam roupas pretas, lembrando os agentes penitenciários. Atrás das suas blusas pretas, há o nome “agente”. Internamente, há vários blocos que se assemelham a pavilhões. Cada pavilhão tem uma funcionalidade: pode ser escola, pavilhão disciplinar e, na maioria dos casos, abrigam os quartos, que são como celas (Mello, 2015, p. 56).

 

  1. O fator midiático e a violência juvenil

Violência não necessariamente é sinônimo de criminalidade, do ponto de vista legal. A mídia, contudo, ao tratar da transgressão da lei pelo adolescente, faz uma abordagem parcial da realidade, sem levar em consideração as causas da violência e, na maioria das vezes, tendo como pilar das discussões apenas a versão policial.

Criminalidade é a violência legalmente combatida. Todo crime perfaz algum tipo de violência, mas nem toda violência se configura como crime. Na maior parte das vezes experimentamos o impacto de um sem número de fatores violentos que reverberam em conflitos de toda ordem, dos quais, nem sempre nos damos conta e, na maior parte das vezes, não são prescritos na lei. A violência pode irromper em um ambiente de forma silenciosa, invisível à maioria dos observadores, porém, intensamente sentida pelas vítimas. A mídia, nesse contexto, não discute as causas da violência entre adolescentes, pois é mais fácil espetacularizá-la do que buscar compreender o fenômeno.

A discussão midiática acerca da violência gravita, de modo geral, apenas no âmbito de seus efeitos espetaculares. “A imprensa não enxerga o contexto, porque não discute soluções. (…) No mais, há um discurso policial justificando a si mesmo e abastecendo os jornalistas, como se não existissem nem causas nem biografias” (ANDI/DCA-MJ/AMENCAR, 2001, p. 26). Nesse tipo de cobertura jornalística sobre o envolvimento de crianças e adolescentes com a violência, os jornalistas se valem pouco de dados de instituições organizadas para tratar da infância no Brasil, bem como de referências bibliográficas e da legislação, o que empobrece o debate.

Ao tratar da violência entre adolescentes é preciso analisar não apenas as transgressões dos adolescentes, mas as causas, os fatores que impulsionam esses atores a entrarem no mundo da transgressão. Uma dessas causas pode ser o estímulo midiático à violência. “Estima-se que uma criança norte-americana média atingindo hoje os 18 anos tenha presenciado cerca de 18 mil assassinatos simulados na televisão”(Carlsson; Feilitzen, 1999, p. 23). Pesquisa global realizada pela Unesco sobre a violência na mídia revelou que 47% das crianças que preferiam conteúdo agressivo na mídia também gostariam de se envolver em situações de risco, particularmente os meninos (Vermelho, 2009, p. 127). Nos Estados Unidos, o Estudo da Violência na Televisão Nacional (ou NTVS — National Television Violence Study) percebeu “uma relação longitudinal entre a exposição habitual na infância à violência na televisão e o crime na idade adulta, sugerindo que aproximadamente 10% da variabilidade no comportamento criminoso posterior possa ser atribuída à violência na televisão” (Carlsson; Feilitzen, 1999, p. 65).

Há de se considerar também, ao tratar do comportamento juvenil transgressor, o fato de que a sociedade capitalista naturalmente estimular o consumo de bens, o que tem levado adolescentes a “projetar um ideal de felicidade atrelado ao dinheiro e à posse de bens” (Rocha, 2011, p.161-179.). Esse ideal de felicidade, fomentado por uma mídia violenta e vivenciado no ambiente de uma família desestruturada propicia que adolescentes optem pelo caminho da transgressão social.

De modo geral, o jornalismo televisivo ao tratar da violência entre crianças e adolescentes não se atem às causas fundamentais que fomentam a transgressão entre adolescentes, antes se resumem a explicar o fenômeno apenas como tradicionais “casos de polícia”, visto que as fontes das reportagens se circunscrevem aos fatos relatados nos  Boletins de Ocorrência (“BOs”) das delegacias (ANDI/DCA-MJ/AMENCAR, 2001, p. 16). Salvo exceções, a maioria da imprensa brasileira não trata a violência entre crianças e adolescentes com imparcialidade. Na verdade, as reportagens da imprensa brasileira informam mal, quando o assunto é violência, por algumas razões: 1) são desprovidas de contextualização; o fato ocorrido é isolado de seu contexto; 2) não investigam as causas da violência; apenas seus efeitos e a sua reverberação na sociedade; 3) não procuram soluções; apenas indicam os problemas; 4) priorizam a descrição de atos violentos; 5) transformam o fenômeno social da violência em “casos de polícia” e a imprensa se torna porta-voz das delegacias; 6) os Boletins de Ocorrência se tornam fontes prioritárias dos jornalistas; nenhum outro documento é pesquisado para montar a matéria jornalística; 7) não responsabilizam o Poder Público, pois este raramente é procurado pela imprensa para se explicar; 8) não cobram a ausência de Políticas Públicas, que mantem crianças e adolescentes pobres sem condições de se livrarem da violência territorial, concluindo, estigmaticamente, que “o lugar da violência é o lugar da carência social”.[3] Ora, a violência, de qualquer tipo, não é um fenômeno monocausal e, portanto, não pode estar associada meramente à carência social, mas sim a uma soma de fatores que, combinados, podem dirigir a criança e o adolescente ao campo da transgressão social.

 

Conclusão     

Não são poucos, nem pequenos os problemas que envolvem a questão do adolescente infrator. Num país onde os “donos do poder” (Faoro, 2012). perpetuam seus domínios e mantêm o povo no esquecimento e profunda miséria, há de se questionar o futuro do adolescente infrator. Vencer ethos criminal e dar ao adolescente uma cosmovisão diferenciada de tudo quanto ele aprendeu e tem aprendido, mesmo dentro instituição cuja proposta é sua ressocialização e reeducação, não é tarefa simples. Se o fosse, as unidades de ressocialização espalhadas pelo país não teriam tantos problemas e os adolescentes ali internados, quando saíssem dali estariam satisfeitos afetivamente, curados de seus traumas, repletos de planos para o futuro. Contudo, o cenário social revela que a conjuntura que envolve o adolescente no mundo da transgressão e o mantém nele é complexa.

Primeiramente deve-se considerar a família do adolescente. A desestruturação familiar provoca na criança uma ruptura com valores fundamentais para o entendimento da realidade. Sem um pai que exerça autoridade e defina limites, a criança e, posteriormente, o adolescente se desenvolverá sem a disciplina necessária que lhe será cobrada mais tarde, não mais pelo pai, mas, pelas forças da Polícia e da Justiça.

As sociedades industrial e pós-industrial vivem, crescentemente, uma crise estrutural familiar e, consequentemente, de paternidade. Os filhos da atual sociedade se criam por si sós e estão à mercê de uma virtual paternidade midiática. A delinquência juvenil tem parte de sua origem na orfandade advinda da sociedade industrial. A sociedade industrial desfigura os laços familiares. “Pela ação da indústria moderna os filhos dos proletários são transformados em simples artigos de comércio e instrumentos de trabalho” (Marx; Engels, 1999, p. 37). Assim, o fenômeno da violência incontrolável permeia a sociedade moderna na medida em que cresce a virtualização substitutiva da paternidade. Essa crise de paternidade envolve todo o sistema midiático televisivo, pois filhos sem pais em casa são adotados por padrastos virtuais.

A violência urbana tem um estreito relacionamento com a mídia televisiva. O aumento da violência nas atuais sociedades ocidentais recebe um incentivo velado, imposto diariamente a milhões de crianças e adolescentes, que gastam horas diante de um aparelho de televisão a apreciar a alta produção de um violento filme ou desenho animado. A mídia televisiva não é a causa da violência, mas um elemento difusor da violência. A transgressão juvenil é parte integrante da sociedade moderna e seu potencial de violência é estimulado pela rendição da paternidade e pelo processo de virtualização das relações sociais, o que implica uma erosão radical dos sentidos e valores universais e a irrupção de um estado de anomia global.

Não bastassem a desestrutura familiar e a paternidade virtual assumida pela violenta mídia televisiva, outros fatores contribuem para envolver e manter os adolescentes no redemoinho da violência urbana. A ineficiência das instituições de ressocialização para adolescentes infratores é um agravante. A privação de liberdade é a medida sócio-educativa extrema, que somente deve ser aplicada ao adolescente infrator quando todas as demais medidas foram tentadas sem sucesso. Manter as instituições de privação de liberdade, especializadas em adolescentes infratores, nas condições em que se encontram há décadas é perpetuar a manutenção da violência.

Como ressocializar um adolescente e reeducando-o na clausura de um ambiente hostil e de intensa violência? Como retirá-lo da vida criminal e ao mesmo tempo obrigá-lo a permanecer em contato com criminosos de todos os matizes? Sem educação, formal e informal, jamais haverá ressocialização, pois esta é realizada em sala de aula, porém sua maior influência se dá fora dela. É na quadra de esportes que se dá a ressocialização; é na mesa de refeições que o adolescente aprende que, mais do que comida para o corpo, pode-se alimentar a mente e a psique. É no ambiente de trabalho dignamente remunerado que o adolescente questionará seus valores, sentir-se-á valorizado como força de trabalho da sociedade e adquirirá novos paradigmas dos custos e benefícios de seu trabalho e existência.

Enfim, tratar da questão da violência entre adolescentes no Brasil envolve uma discussão ampla. Em se tratando da combinação entre violência e adolescência “estamos diante de um comportamento epidêmico; ao invés de fazermos política de segurança pública por meio de demagogia, devemos repreendê-la de modo responsável”.[4] Cabe ao Estado e à sociedade envidar amplos esforços para que o adolescente em conflito com a lei seja recuperado e se some aos demais brasileiros na construção de um país melhor.

Artigo publicado originalmente na Revista Raízes no Direito, Vol. 7, N.º 1.

 

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Notas

[1] FONACRIAD é a sigla que identifica o “Fórum Nacional de Dirigentes Governamentais de Entidades Executoras da Política de Promoção e Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente”.

[2] Declaração de Paulo Sérgio de Morais Sarmento Pinheiro, por ocasião do lançamento do livro “Mapa da Violência III: os jovens do Brasil”, em evento promovido pelo Ministério da Justiça.

[3] Declaração de Paulo Sérgio de Morais Sarmento Pinheiro, por ocasião do lançamento do livro “Mapa da Violência III: os jovens do Brasil”.

[4] Declaração de Paulo Sérgio de Morais Sarmento Pinheiro, por ocasião do lançamento do livro “Mapa da Violência III: os jovens do Brasil”.